A função da leitura na formação do psicanalista

Publicado em 12/11/2022

 
Os estudos designados como leitura na Psicanálise&Cultura têm como proposta a dedicação de um grupo de pessoas, membros e/ou participantes, ao trabalho de leitura de um texto, ou de textos selecionados referentes a um tema determinado. Mas não somente.

O trabalho de leitura em psicanálise vai além da fruição do texto escrito, linha a linha, criteriosamente. Envolve a apropriação do escrito por cada um, levando em conta o lugar de cada sujeito em seu percurso de formação e em que pontos pode ser atravessado pela leitura. Para além da sua apropriação para a produção de conhecimento, interessa que cada leitor possa ser provocado pelo texto, e de acordo com os significantes que porta, ser fisgado por ele. Erik Porge em "Ler, escrever e publicar: o estilo de Lacan" aponta que o leitor precisa colocar algo de si.

Tendo como referência fundamental o estatuto diferenciado entre conhecimento e saber que a psicanálise propõe, faz-se a aposta de que o trabalho de leitura opere não a construção de um conhecimento, mas que, mesmo diferenciando-se de um funcionamento de cartel em vários pontos, promova algo que se aproxime à produção de um saber. O saber diz respeito ao inconsciente do leitor, um saber a ser construído. O leitor tem que se colocar recortando o que no texto comparece como não organizado simbolicamente, aquilo que lhe escapa, que lhe causa estranheza, questionamento, aquilo que lhe é da ordem do indizível, para tentar articulá-lo com um dizer, produzido por ele próprio. Colocar-se ao exercício de ler é fundamental para o estabelecimento de um leitor.

Ser tomado pelo texto, ser lido pelo texto, é o que se pode esperar, pois se lê com os significantes próprios. Há um momento de alienação aos textos, aos significantes do autor, mas deve haver um momento de separação, onde o leitor possa dizer o mesmo à sua própria maneira. Assim, cabe a cada leitor elaborar o conceito a que se dedica a depurar, fazendo laço com o que lhe é particular, com os significantes que possui, com a sua própria experiência – enquanto analista praticante e em análise – e com os significantes provindos de Lacan.

A leitura busca clarear os conceitos que nunca estão solitários, sempre remetidos a outros conceitos, por isso a leitura não é acabada, está em constante construção.